Quem consome pornô gay já percebeu a diferença. O sexo bareback (nome dado ao sexo anal entre homens sem camisinha, ou o que os heterossexuais chamam simplesmente de sexo) está disseminado em todos os lugares. É impossível visitar agregadores com o Xtube ou Xvideos sem se deparar com uma profusão de tags como “creampie”, “cumwhore” e mesmo “sem camisinha” ou “sexo no pelo”, e entre um vídeo e outro me pergunto: será mesmo que estas pessoas são namorados? Fizeram o teste ou estão fazendo sexo “desprotegido” sem pensar nas consequências?
Mas… “quem pensa em Dst numa hora destas?!” É caro leitor, sou destes, e seria impossível pensar diferente. Somos um produto do nosso tempo, e eu do alto dos meus 30 anos, já estava consciente das implicações do sexo sem camisinha desde muito cedo. Presenciei a face da doença estampada na capa da revista Veja com Cazuza e cresci nos anos noventa, muito antes dos antirretrovirais transformarem o que era uma sentença de morte em uma doença crônica e manejável, como o diabetes (eu sei, não é nem de longe o melhor exemplo).
Há que se analisar alguns fatores e aqui tomo a liberdade de fazer um paralelo com a situação nos Estados Unidos. Lá desde o surgimento do Truvada (Prep – que é a chamada profilaxia pré exposição, que efetivamente previne a infecção do vírus Hiv), os grandes estúdios pornô aderiram a cenas de sexo sem camisinha. Havia agora uma maneira comprovadamente segura de evitar a contaminação (99% de chance, caso o remédio seja utilizado de forma correta). E então grandes estúdios como a Lucas Entreteiment, Tim Tales e Sean Cody passaram a produzir o conteúdo “sem capa”.
Em entrevista para o site Querty em Março de 2014 o Ceo, ator e diretor Michael Lucas deu a seguinte declaração quando perguntado sobre a mudança no em seu posicionamento pessoal e de sua empresa em relação o uso de preservativos:
Por muitos anos, como você sabe, eu veementemente me opus ao sexo bareback nos vídeos, porque senti que isto estava colocando os atores em risco. Mas os tempos mudaram. Tratamentos de Hiv agora podem reduzir a carga viral a tal ponto que, até aonde se pode afirmar, representam pouco ou nenhum risco de transmissão. Combinando isto a Prep (Truvada) para as pessoas Hiv-negativas, estamos falando de um perigo muito, muito menor do que antes. A minha posição sobre o sexo bareback na pornografia adaptou – se de acordo com estes avanços. E não apenas no pornô: Eu mudei a maneira de fazer sexo também na minha vida pessoal. Eu sou Hiv – negativo, mas recentemente me relaciono com alguém que é Hiv – positivo, e fazemos sexo sem preservativo. Então, eu me sinto bem, agora, em pedir que meus atores façam o mesmo.
Obviamente que os avanços científicos afetariam diretamente uma indústria que sempre soube adaptar – se as mudanças tecnológicas, mas a decisão é também financeira, como é possível perceber em outro trecho da entrevista:
A indústria mudou. Cenas sem preservativo são muito mais populares entre os consumidores do que cenas com preservativos, e a maioria das empresas (agora incluindo a minha) ajustou – se a essa realidade. Não posso falar sobre o estado financeiro de outros estúdios, mas sei que muitos faliram nos últimos anos ou foram “comprados” por grandes corporações. Se a indústria tivesse ficado unida em torno do uso do preservativo, então isso seria uma coisa, mas isso não aconteceu. E isso significa que as empresas que produzem apenas pornô com preservativos estão colocando-se em grande desvantagem. No final, isto é um negócio, e não podemos nos dar ao luxo de ignorar o que os consumidores querem da pornografia hoje. Eu estendi o uso de preservativos enquanto pude, mas com a chegada de Prep e as novas informações sobre as cargas virais indetectáveis, o princípio por trás da decisão não era tão atraente quanto costumava ser.
Esta situação deixou atores sem opção, o que fazer quando o mercado mudou e mais de 80% das cenas filmadas são de sexo “bareback”? Em uma declaração o ator australiano Rogan Richards (que era um dos poucos performers que ainda utilizava o preservativo em suas cenas) ao lançar cenas bareback em seu site:
Por que fazer “no pêlo” agora? Porque “o sexo seguro não é mais uma opção viável”!
Muitos estúdios agora seguem o caminho do famoso e polêmico Threasure Island Media, que já produzia cenas exclusivamente bareback muito antes do surgimento do Prep ou mesmo antes dos exames sofisticados estarem disponíveis, inclusive “fetichizando” a transmissão do vírus como no vídeo de Viral Loads (algo como “Gozadas Virais”) de 2014, onde um passivo recebe dentro de si um líquido, que segundo o estúdio são 200 ejaculações de homens soropositivos, aqui um pedaço do texto de divulgação do vídeo:
O moleque submisso e disposto é fodido por um quarto repleto de machos. A maioria são “poz” (Hiv-positivos), alguns são “neg” (Hiv-negativos). Mas quem se importa? Não ele, com certeza! Para terminar a sua iniciação, nós trouxemos um frasco cheio de mais de 200 gozadas “positivas (…)”
Mas e no Brasil, como os estúdios se comportam? Bom, em sua maioria os estúdios que produzem o conteúdo gay, ainda mantém o uso da camisinha, regra esta que foi “auto – imposta” internacionalmente nos anos 80/90 entre os produtores de conteúdo adulto. Sites como o Meninos Online e o Mundo Mais, trazem em sua absoluta maioria cenas de sexo protegido. A exceção são os estúdios internacionais que recrutam atores brasileiros para suas cenas onde o sexo é desprotegido como Macho Fucker ou Dark Alley, e o site carioca Hot Boys.
Em uma recente entrevista para o canal de Youtube da Drag Pandora Yume, o ganhador do Prêmio Sexy Hot, de melhor ator estreante, Andy Star, revelou quando perguntado sobre as preocupações dos estúdios brasileiros com a saúde dos atores:
“No Brasil existe uma lei que proíbe os sites de exigirem testes, então não fica a critério da empresa (…) O que acontece é que se um ator só faz sexo bareback com testagem, o outro ator também faz testagem (…) é assim que funciona.”
A diferença entre a legislação brasileira e norte – americana é gigantesca, lá os atores/modelos para trabalhar na indústria fazem testes para o vírus hiv e doenças sexualmente transmissíveis a cada 14 dias, por exemplo.
A matéria ficou grande, então dividimos em três partes, para acessar a segunda parte, clique aqui.
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